“O mais intrigante é que esse projeto de lei foi aprovado com uma facilidade dificilmente vista”
Maria Rita Martins*
Segundo o Código Florestal, serviços ambientais é o conjunto de processos naturais dos ecossistemas capazes de assegurar a ocorrência da vida no planeta e a condições para as atividades produtivas, sendo o pagamento ou incentivo à esses serviços uma retribuição, monetária ou não, às atividades de conservação e melhoria dos ecossistemas e que gerem serviços ambientais como a manutenção de Áreas de Preservação Permanente e da Reserva Legal, a conservação e o melhoramento do solo, a conservação da biodiversidade e a conservação das águas e dos serviços hídricos.
Em 2010, com a renovação do contrato entre a Sabesp e a Prefeitura Municipal de Botucatu, foi acordado que pelos próximos 30 anos daquela data, a Sabesp destinaria 4% de sua receita líquida para a prefeitura municipal, sendo 3% destinados a obras de revitalização, infra-estrutura e saneamento ambiental e 1% para instituir um programa de pagamentos de serviços ambientais, como forma de preservação de nascentes, rios e córregos do município.
Para controlar esses recursos, referentes ao 1%, foi sancionada em 21 de maio de 2013 a Lei Complementar n. 1.045 na qual se criou o Programa de Pagamento por Serviços Ambientais (PPSA), que, segundo seu Art. 1°, era direcionada ao proprietário ou ocupante regular de áreas rurais ou urbanas no município, que destinassem parte de sua propriedade para fins de preservação e conservação de serviços ecossistêmicos.
No entanto, na última sessão da Câmara dos Vereadores, no dia 22 de junho de 2015, foi aprovada por 8 votos a 2, a mudança da Lei n. 1.045. O novo projeto de Lei (n. 16 de 19 de maio de 2015), aprovado nessa sessão, permitirá que os recursos destinados ao PPS sejam utilizados para “a reservação e distribuição das águas e dos serviços hídricos”.
Recentemente, foi divulgado o interesse da Prefeitura de Botucatu e da Sabesp em estudos para a construção de um reservatório de água no Rio Pardo, onde hoje se encontra a barragem do Véu da Noiva. A mudança desta Lei do PPSA permitirá que um recurso que deveria ser utilizado pela população botucatuense, para a conservação e preservação dos recursos hídricos, seja usado por uma empresa de capital misto em investimentos próprios, os quais futuramente nos serão cobrados mensalmente nas contas de água e esgoto. Um recurso que deveria bonificar um proprietário rural que preservou suas nascentes, seus rios, contribuiu para a produção de água, a qual beneficiaria a todos, beneficiará quem explora o recurso natural e não o preserva.
O mais intrigante é que esse projeto de lei foi aprovado com uma facilidade dificilmente vista, sem passar por uma discussão com órgãos ambientais e, principalmente, sem o conhecimento da população.
A vereadora Rose Ielo (PT), numa tentativa frustrada de aprovação de seu requerimento n.504, ainda tentou apontar que existem outros recursos para se investir nesses estudos, como os 3% que podem e devem ser direcionados para saneamento público, mas tal requerimento foi reprovado.
Ainda mais intrigante é pensar que todo o novo Código Ambiental de Botucatu foi elaborado em função dos recursos que viriam do PPSA, como forma de incentivo a preservação dos mananciais.
Agora, fica a dúvida: Sobrarão recursos para bonificar quem preservou e manteve nossos rios em bons estados de conservação?
*Maria Rita Martins é Engenheira Florestal, Doutoranda em Ciência Florestal na Unesp/Botucatu e Coordenadora de áreas naturais protegidas – ONG SOS Cuesta de Botucatu
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